terça-feira, 8 de setembro de 2009

Uma vitória do Rio de Janeiro: Funk é cultura!

Vamos lá. Na terça-feira passada, dia 1º de setembro, a ALERJ derrubou a lei que criminalizava o funk e aprovou a lei que reconhece o funk como atividade cultural. Trata-se de duas resoluções importantes. Primeiro porque acaba com a proibição, o que é fundamental para uma abertura de diálogo e circulação na sociedade civil. O funk não é mais caso de polícia e possui a mesma liberdade de circulação como qualquer outro ritmo musical. Segundo porque reconhece a iniciativa de jovens, na maioria negros, pobres, na maioria moradores de favelas, que manifestam, por meio de uma expressão cultural, as realidades nas quais convivem. Para qualquer um com algum compromisso democrático e que defenda a liberdade de expressão se trata de um avanço significativo. Mas para alguns não.
Evidente que não haverá unanimidade em quase nada. E surgirá agora, com alguma recorrência, matérias que busquem desqualificar o símbolo de cultura argumentando algumas letras que façam apologia ao sexo ou ao tráfico. Apologia ao sexo é o que não falta na música brasileira. Mas não é por isso que elas são ou não perseguidas. O samba não foi perseguido pela existência de apologias, mas porque era de pobre e, como tal, foi considerado “coisa de vagabundo”. As pessoas ligadas ao samba eram presas, detidas, perseguidas. Muitas vezes bastava ser pobre e ter a unha da mão direita maior que a da esquerda, pronto: esse ai toca samba! No funk ainda não tem violão, cavaquinho, etc, mas quem disse que não podemos dar um jeito. Bom... Mas nem é essa a discussão, pois não se trata de gostar ou não do ritmo, trata-se sim de uma visão minimamente republicana e democrática.
O funk é cultura e uma expressão cultural do Rio de Janeiro que se materializa em um manifesto de negros, pobres, moradores de favelas. A criminalização do funk, impedindo que fosse tocado por toda a cidade empurrou ele para o gueto. Qualquer festa que se produza em territórios nos quais o Estado não governa vive a tensão de ser controlado ou apropriado pelo o poder local que domina tais territórios. Isso não é uma característica somente do funk. No entanto, esse, em particular, era proibido. Acabar com a proibição, trazer o debate para o campo da cultura e da educação, retirar a expressão cultural do campo de debate de polícia, foram ações fundamentais e conquistas que o Rio de Janeiro obteve na votação da ALERJ no dia 1º de setembro. Então agora, no lugar do preconceito, precisa-se debater a cultura na sua totalidade, no lugar de escolher uma expressão cultural para descriminar. E é bom lembrar, não se aprovou um decreto para a população gostar de um ou outro ritmo; o que se aprovou é o reconhecimento dessa manifestação como cultura. Foi aprovada a liberdade desse ritmo em circular como os outros e se submeter às mesmas leis que todos os outros se submetem. O funk não foi “imunizado”; abriu-se um processo legal de descriminalização e liberdade. Fruto de um processo legítimo que a galera da APAFUNK conquistou na luta com uma grande aliança democrática.
Estamos querendo abrir esse debate com a população. Queremos desmanchar uma capa muito mal situada da classe média que confunde tudo em nome de uma hipocrisia sem fim. As letras que fazem apologia a sexo, violência e outras coisas mais não são de propriedade do funk. A diversidade musical, poética e, em última instância, cultura é própria de sociedades democráticas e são resultados das condições de vida nas quais predominam – predominância para grupos sociais ou para o conjunto da sociedade. Assim como a ditadura militar no Brasil trouxe uma realidade que foi respondida por várias manifestações culturais, o funk também responde a realidade das pessoas que vivem em favelas e são excluídas, por iniciativa do próprio estado, ao conjunto da cidade. Queremos fazer esse debate. Não aceitamos opor a favela ao asfalto; muito menos opor a favela a cidade, como fazem os governos impedindo que o mesmo poder que predomina no conjunto da sociedade predomine também nesse território específico. Ou seja, debates temos muitos para fazer. O que não vamos fazer é retroagir: o funk não é mais caso de política; é caso de cultura, de educação, de democracia, de manifestação sócio-cultural! Vamos nessa!

6 comentários:

Paula Máiran disse...

Não tem lei que possa impedir o funk de existir, de irromper feito lava das entranhas desse nosso Rio de Janeiro em permanente erupção. As leis recentemente aprovadas na Assembleia Legislativa refletem a força do fenômeno natural do funk, de seu poder de se impor como manifestação cultural legítima. As novas leis são importantes porque corrigem um erro histórico do Estado e da sociedade em relação ao funk, mais do que um gênero musical um jeito de viver, de a massa jovem, negra e favelada se libertar de uma existência subterrânea forçada, invisibilizada por força do preconceito atroz das elites.

Jovens de Volta Redonda disse...

Mandou bem!!!!

Edu Alves disse...

Como disse o poeta: “os lírios não nascem das leis”. A realidade do movimento do funk se impôs e a aprovação das leis foi resultado de uma grande luta. A luta não acabou. É necessário disputar o senso comum sobre o funk e travar uma boa disputa sobre as questões trabalhistas que envolvem os direitos dos funkeiros. Temos uma estrada pela frente, pois, não é possível conviver com idéias que associem o funk com o crime organizado ou o crime desorganizado. Sustentar coerentemente o funk como expressão cultural tem como resultado a exigência da liberdade a da circulação amplamente democrática. Há muito o que fazer.

Unknown disse...

Bom,não vou exatamente entrar na discussão do funk, apesar de reconhecer sua legitimidade e negar a perspectiva "civilizada" que está na raíz da perseguição de que ele é objeto. Quero mais é te encorajar na continuidade da empreitada - difícil, irmão! Demanda tempo e muita dedicação. Mas para isso conte com os amigos. Posso te mandar artigos, imagens e coisas assim? Mesmo que nâo sejam de minha autoria? bjs, Marcia Guerra

Unknown disse...

Oi, Edu.

Serei sua leitora.

Beijos

Unknown disse...

Belo texto! vida longa ao edublog!
bjos,
Adriana Facina